Há muito tempo que
não me lembro de estar embasbacado a olhar o Cavaco a discursar na tv. Mas,
desta vez, estava com uma espécie de pressentimento e lá acabei por me sentar
com toda a atenção, quase obediente, em frente ao écran.
Tivemos quase duas
semanas ou mais, já não me lembro bem, de telenovela política com o Gaspar a
demitir-se, a Maria Luís professora do Passos a tomar posse no dia seguinte e,
uma hora antes dela tomar conta do lugar em Belém, o Portas a seguir o exemplo
do Gaspar. Portas, irrevogável, assim é que é. É d’homem.
Tudo pura farsa.
Tivemos direito nas horas seguintes a cenas patéticas, patéticas e palacianas e
o inesperado entendimento entre os dois jovens chefes políticos que têm andado a
destruir o país.
Acabaram por se entender
os dois chefes, fabricaram entre eles uma redistribuição de poderes e de
papéis. Na sexta-feira estavam muito contentes e, para sublinhar o seu
contentamento, apareceram lado a lado. O mundo sorria-lhes, só faltava um
pequeno pormenor, a rubrica do patrão, o Doutor Cavaco
E assim chegou
quarta-feira, foi há duas horas, a hora do Cavaco.
Confesso, fiquei
impressionado, o homem revelou-se mestre de suspense, não sei se gosta de
cinema, talvez tenha arranjado um novo conselheiro.
O que proclamou é
totalmente inesperado, deixou os chamados partidos do arco da governabilidade
completamente à nora, sem bússola, sem norte, demoraram imenso tempo a abrir a
boca e quando a abriram não disseram nada.
Em que ficamos quanto
ao “compromisso de salvação nacional” que o Cavaco, impôs aos tais partidos?
Em primeiro lugar, o
governo recauchutado pelo Passos e pelo Portas entra para história das anedotas
políticas. È finito. O que é mais provável é que, por algum tempo ainda, não vai
ser muito, continuará a existir um governo PSD/CDS com todos os seus ministros sobreviventes.
Mas será apenas um governo de gestão.
Secundo, entre Julho
de 2013 e Junho de 2014, várias coisas podem acontecer.
O governo de gestão
decidido hoje pelo Cavaco não consegue aguentar-se, à sua base de apoio social,
partidária e parlamentar acontece-lhe o efeito da pele de chagrém, diminui,
diminui, desaparece, morre.
E, quando a pele de
chagrém chegar ao fim, o que é que teremos? Apesar de todos os argumentos esgrimidos
pelo Cavaco contra as eleições antecipadas em Setembro e a favor das ditas
cujas eleições em Junho, ele vai ter rapidamente que nomear aquilo que sempre
recusou e que agora, depois do seu discurso à nação, está já em rampa de
lançamento, em contagem decrescente como os foguetões: um governo de iniciativa
presidencial, com mandato até Junho e com o apoio dos tais partidos do tal
arco.
Solução à italiana,
quem é o Berlusconi a abater? Adivinhem.
O Cavaco salva a face, retoma a iniciativa e o poder presidenciais, a troika não tem outro remédio, apoia o nosso
homem.
Já está tudo
preparado no discurso do Cavaco. Para que é que serve aquele misterioso “mediador”
que ele se propõe designar para impor o tal “compromisso de salvação nacional” aos
três partidos?
Esse mediador será o
próximo primeiro-ministro de um governo de iniciativa presidencial, governo ao
qual competirá consumar nos próximos meses todas as tropelias impostas pela
troika. Tropelias, desmandos, cortes, austeridade, que actualmente nenhum
partido dito governamental tem coragem de fazer sozinho ou acompanhado. Gaspar
dixit.
Em Junho de 2014 logo
se verão os resultados. Nessa altura, o Cavaco decidirá sobre as eleições
antecipadas, com o beneplácito da troika, ça va de soi.
Os políticos e os
comentadores, jornalistas e esse pessoal todo das tertúlias do grande
pensamento político nacional, toda essa gente foi apanhada em cuecas pelo nosso
distinto presidente. Vão levar tempo a compreender o que lhes aconteceu.
Volta Gil Vicente,
estás mais do que perdoado, não fizeste mal a ninguém, a não ser aos poderosos.
Meu caro, és mais do que um profeta, não nos abandones. Ajuda-nos a manter
inteligência suficiente para que sejamos capazes de sorrir por entre as
desgraças.
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