Estamos em plena
guerra europeia, a maior parte dos europeus não se dá conta disso, é uma guerra
que se aproxima do seu momento de verdade. Momento do salve-se quem puder.
Não há bombas, nem
artilharia nem exércitos, por enquanto é apenas uma guerra de bluffs.
O bluff do Rajoy
espanhol, por exemplo. A Espanha está falida, é seguramente o país mais falido
da UE, vejamos o pódio europeu dos mais falidos: medalha de ouro Espanha 25 %
de desemprego, medalha de prata Grécia 23%, medalha de bronze Portugal 16%.
A Espanha, grande
potência de antigamente e orgulhosa do seu milagre económico dos anos 90, descobre
de repente que é o país mais falido, pede 100 mil milhões de euros a Bruxelas e
o empréstimo é concedido à velocidade da luz.
A justificação para
esta pressa toda são as eleições gregas.
Tudo cálculos
errados.
A maneira como o misterioso
empréstimo espanhol foi anunciado, empréstimo supostamente reservado aos bancos
sem intervenção de qualquer troika e de um memorando de austeridade, tudo isso só
veio aumentar a desconfianças da suprema autoridade metafísica que regula a
finança internacional, suprema autoridade genericamente assimilada a diferentes
heterónimos, mercados, agências de rating, investidores, autoridades
reguladoras financeiras internacionais, bolsas de valores, fundos
obrigacionistas…
Os co-autores do
golpe espanhol queriam evitar o contágio grego. Na volta, aumentaram a pressão
sobre a própria Espanha, colocaram a Itália na berlinda e puseram também a França
a tremer.
O Hollande francês
ostensivamente não se entende com a chanceler alemã e aproxima-se do Mário
Monti e do renitente Rajoy que se tem andado a fazer de esquisito. Este tipo menosprezou
o Hollande quando este foi eleito, andou a prestar vassalagem à Merkel, que é o
que o P. Coelho tem andado a fazer, e agora, como está no mato sem cachorro,
começa a pedir a protecção francesa. Um verdadeiro desastre.
Todos os
realinhamentos políticos de países do sul europeu, que parecem estar agora na
calha, já deviam ter começado há pelo menos quatro anos.
Agora é tarde.
É tarde para toda a
gente.
É tarde, em primeiro
lugar, porque deixou de haver política e políticos dignos dessa função. Fim da
História, diria o Fukuyama, mas não é disso que se trata. Dantes havia quem
gritasse Deus está morto, era uma provocação. Para que Deus estivesse morto era
necessário demonstrar que alguma vez tivesse estado vivo.
A verdade não é Deus
que está morto, o que morreu foi a Política.
O lugar deste histórico
defunto, nascido entre Maquiavel e a Revolução Francesa, foi ocupado agora pelos
bancos e seus banqueiros, que transformaram as nossas vidas em números
manipulados por engenharias e híper-corrupções, traficados por bancos e por
banqueiros que ganham biliões e controlam as bolsas de Wall Street e
congéneres, as bolsas de matérias primas, as bolsas dos bens alimentares, da
água, da energia, as telecomunicações.
A lista do poder
destes poderes ocultos não tem fim.
Estamos hoje a dois
dias das eleições gregas.
Lembremos que, entre
6 de Maio e 17 de Junho de 2012, não passou sequer um mês e meio.
Em Dezembro de 2011,
a Alemanha e os seus compinchas europeus obrigaram o Papandreo a renunciar ao
seu referendo sobre o euro e a demitir-se. Antes disso, os irlandeses foram
obrigados pela chamada “união” europeia a repetir um referendo sobre um tratado
europeu, já nem me lembro qual.
Mas nunca nenhum país
europeu tinha sido obrigado a repetir eleições legislativas com menos de mês e
meio de intervalo.
É a união soviética
europeia que temos, a união do centralismo democrático em todo o seu esplendor,
que decide em nome da democracia e do povo. Sobre isso, já estamos conversados
há muito tempo.
O problema é que as consequências
chegaram à sua hora da verdade.
A Lagarde do FMI
anunciou que só tínhamos três meses. Três meses para quê?
Sejamos realistas.
Quanto ao pânico europeu acerca das eleições gregas de domingo, os resultados
vão dar razão aos europeístas militantes mais pessimistas.
As eleições não vão
resolver nada e nada quer dizer nada daquilo que querem os mandões que têm
esmifrado o elo mais fraco da “união”, ou seja os países mais pobres e
periféricos,
Os bancos alemães, o
Goldman Sachs, o Morgan, o Crédit Agricole e toda a matilha de especuladores
que têm apostado nos juros fabulosos que cobram aos gregos e aos periféricos e
nas compras hiper-fabulosas dos restos das economias desses países, toda essa
quadrilha vai entrar em pânico.
Não vão ter um
parceiro que continue a fazer-lhes as vontades.
É que a lógica
puramente bancária do capitalismo puramente capitalista não tem golpe de rins
suficientemente ágil para discernir até que limites é que pode ir o seu terrorismo
bancário. Matam o doente, quem é que lhes vai continuar a pagar os juros, quem
é que lhes vai continuar a comprar as mercadorias?
Não é provável que
das eleições gregas saia um governo viável e consistente. Quer seja um governo
obediente à troika, quer seja um governo rebelde de esquerda.
Donde facilmente se
deduz que os gregos serão chutados para fora do euro e da união soviética
europeia. Coloca-se então a fatídica questão: quem é que vai governar a Grécia?
Os militares?
Qualquer que seja a
solução, a falência grega representará a falência da pura lógica bancária do
capitalismo puramente capitalista.
Mas, por outro lado,
significará o regresso da política internacional puramente política.
Os gregos ficarão a
saber com que amigos é que podem contar.
Aceitam-se apostas.
Muitos novos amigos
vão bater às portas da Grécia falida e expulsa do euro.
Prefigura-se neste
caso uma repetição da história simbólica da jangada de pedra do Saramago. A
Grécia é um conjunto de territórios rodeados de água por todos os lados. A
água, o mar convidam à viagem.
Os gregos desamarram
da Europa, do velho continente e rumam mais para oriente e para sul, destinos
não lhes faltam. Viajam, vão conhecer esses novos destinos, a Rússia e a
próxima Ásia, o Oriente médio e próximo, o Egipto e o Magreb do jasmim
primaveril.
A Nato já deverá ter
desculpas preparadas para minimizar as consequências da viagem dessa nova
jangada de pedra.
É que, desde que foi
abandonada pelo inimigo Pacto de Varsóvia e perdeu a sua razão de ser, a
NATO tem passado o tempo a descobrir
novos destinos. Persegue a Al Kaeda, manda tropas para o Afeganistão, para o Yémen
e para a Líbia. E, naturalmente, após o colapso do Kadhafi, tem planos para se
instalar no Mali, no Sahara, na Costa do Marfim, sabe-se lá onde é que isso vai
levar.
Segunda-feira, 18 de
Julho de 2012, face à débacle grega e ao que se lhe vai seguir, continuará a
haver entusiastas europeístas bem instalados na vida com razões para proclamar
que não há nada de novo na frente ocidental.
Frente ocidental,
frente de guerra. Quem serão os vencidos, quem serão os vencedores?
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