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quarta-feira, 28 de março de 2012

FASCISMO PÓS-MODERNO EM CENA NO CHIADO


O mais simples senso comum dizia-nos, estava à vista, que a anunciada greve geral da semana passada ia ser um fiasco. Foi um fiasco.


Não falemos, pois, dessa greve dita geral, concentremo-nos nalguns factos ad latera, que são factos extremamente preocupantes.


O assalto à liberdade de manifestação que se consumou na semana passada, entre outros sítios, no largo do Chiado em Lisboa, começou na anterior greve geral em Novembro. Estou-me a referir a tudo o que aconteceu nessa altura em frente à Assembleia da República, aquelas cenas junto às escadarias de S. Bento, com policiais provocadores fardados e não fardados que sacaram e agrediram jovens manifestantes que ali estavam pacificamente.


Os provocadores policiais levaram esses jovens, deram-lhes porrada, fizeram-nos desaparecer para destinos desconhecidos. Até hoje não se sabe o que é que lhes aconteceu. Todas essas cenas de banditismo perpetradas em nome de razões de Estado ficaram por esclarecer, nunca mais se falou no assunto. Os jornais, a televisão fizeram-se desentendidos, os tribunais, já sabemos, para que servem os tribunais?


Foi um ensaio, esses atentados de Novembro de 2011 anunciaram não apenas o que se passou no dia da greve geral da semana passada, mas também tudo o que poderá vir a acontecer nos tempos futuros.


Tal como em Novembro, a polícia e os seus agentes provocadores não atacaram os manifestantes sindicais, deixaram passar o pessoal da CGTP. O próprio ministro explicou porquê, é gente responsável, ele lá terá as suas razões.


Em Novembro, os sicários do governo atiraram-se aos protestantes informais do movimento dos indignados, na sua maioria jovens precários e desempregados. O cenário repetiu-se agora no Chiado. A desproporção era enorme, havia mais polícias do que manifestantes, os polícias estavam fardados e eram agentes provocadores agindo segundo as ordens do ministro do Interior e do chefe do governo.


A imprensa e o presidente da República deram imensa importância ao facto de dois jornalistas terem sido vítimas da selvajaria policial no largo do Chiado. Mas nem uma palavra para todos quantos estavam ali apenas para manifestar a sua oposição às políticas do governo e que acabaram por levar porrada a sério, com sangue à mistura.


A imprensa concentrou a sua atenção nas imagens da televisão, mas ignorou muitas outras situações que aconteceram pelo país fora, todas mais ou menos idênticas.


Não muito longe do Chiado, uma horda de polícias de choque fechou a rua do Alecrim e todas as ruas na zona do Cais do Sodré, onde não se passava nada, onde ninguém estava a manifestar. Havia pessoas que se limitavam a passear na rua, nem sequer eram muitas, por ali não se passeia muito, havia outras que simplesmente tinham ido beber um copo e conversar num dos inúmeros bares ou cafés que existem por ali. Gente pacífica que não ameaçava a ordem pública, gente que não estava a fazer mal a ninguém. Qual o quê, diria o Chico Buarque.


Obedecendo às ordens superiores do fascismo pós-moderno que está a tomar conta do país supostamente a mando da troika, o bando de polícias entrou nos cafés, entrou nos bares e pôs toda a gente na rua, encerrou, bateu, ameaçou, agrediu verbalmente, levou gente para as esquadras.


Havia algum jornalista por ali?


Não, os jornalistas estavam todos no Chiado. Presumo que tenham recebido recados da polícia e dos serviços secretos, “atenção ao que se vai passar no Chiado, estamos à espera de graves acontecimentos, agitadores profissionais prontos a atentar contra a segurança do Estado”.


É o regresso da PIDE.


Regresso confirmado hoje pelo artigo do Público intitulado “Inquérito aos incidentes no Chiado concluído após as férias da Páscoa”. O artigo é esclarecedor sobre o neo-fascismo para que caminhamos.


Fala dos “incidentes” do Chiado, mas logo a seguir refere que o ministro admite que “os incidentes não chegaram às quatro dezenas em todo o país”. Quatro dezenas, acham pouco, que história é essa, onde é que foram os tais incidentes, quantos feridos, quantos presos, quantos agredidos? Ò srs. jornalistas, por que é que não investigam, pagam-vos para não investigar, quem é que vos paga?


Eu não sou jornalista, não andei a investigar, mas em conversa com uma amiga fiquei a conhecer a odisseia de três jovens mulheres que foram tomar um copo e conversar num estabelecimento do cais do Sodré, estabelecimento que, aliás está na moda, e que acabaram por ser presas e algemadas, cada uma metida numa carrinha da tropa de choque, agredidas, metidas numa cela policial, presentes a um juíz e libertadas apenas muitas e muitas horas depois de lhe ter caído a horda policial em cima.


Coincidência das coincidências, na mesma semana em que se comemoraram os 50 anos da crise académica de 1962, crise em que estiveram envolvidos muitos ilustres personagens de hoje, incluindo o anterior presidente da República, vale a pena fazer comparações.


Em 62, houve manifestações, greves da fome, estudantes presos, tudo normal, estávamos numa ditadura. Ainda faltavam doze anos para a liberdade, que, aliás, havia de ser conquistada em grande parte graças aos jovens que há 50 anos lutavam contra o regime salazarista.


Cinquenta anos depois, vamos entrando num buraco negro. O SIS, serviços secretos, a mando do governo manipula a comunicação social, inventa “cenários catastrofistas”, dá rédea solta à polícia, ninguém está a salvo.


Entre os que mandam, ficamos com a sensação de que todos estão em pânico, os serviços secretos, a polícia de choque, o governo. Estão sem norte, preparam-se para responder a hipotéticos cenários de violência, a democracia que se dane.


Os tribunais só existem para proteger os ricos, a tropa vai remoendo impotente, o Paços Coelho faz charme à Merkel, o país corre para a bancarrota.


Greve geral? Só e quando for para deitar abaixo o regime que nos desgoverna.


Preparemos a greve geral que nos salve do fascismo pós-moderno.


Entretanto, se forem tomar um copo à brasileira ou ao cais do Sodré vão em grupo e vão preparados. Organizem-se contra os bandos neo-fascistas de cartão passado pelo Estado, criem associações, apostem na solidariedade, na acção política, deixem-se de pieguices.



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