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sexta-feira, 8 de julho de 2011

CAPITALISMO TÓXICO


Alguma gente, que tem andado muito caladinha, começou ontem a falar contra as agências de rating. Como de costume, acordaram tarde e a más horas, isso não me admira. As elites da nossa praça é gente sem convicções, limitam-se a defender os seus interessezinhos, abrem a boca apenas quando levam um murro no estômago.


Agora resolveram mandar vir contra as agências de rating e contra a passividade da união europeia, enchem o peito com ar de querer parecer gente de coragem.


Banqueiros que têm que refilar em causa própria, não têm outro remédio, políticos da direita, da esquerda e do governo sempre a reboque dos acontecimentos e das suas vaidades e mediocridade. Gente que tem utilizado o país a seu belo prazer, gente que tem mentido, gente que tem roubado.


Gente que não se deu ao trabalho de alertar o país acerca dos meandros, das teias e da conspiração dos sectores dominantes do capitalismo financeiro europeu que querem tomar conta da união europeia.


Gente que se recusa, e que considera essa simples hipótese como um pecado capital, discutir a pertença de Portugal à União Europeia e/ou ao euro, a fatídica moeda única.


De repente, como se tivessem sido iluminados pelo Altíssimo, estes senhores descobriram o lobo mau.


Como se diz, vozes de burro não chegam aos céus e para se perceber a engrenagem diabólica que armou a armadilha, passe o pleonasmo, em que caiu o periférico país que somos, para se perceber os meandros da estratégia da aranha que vai ser mortal para as democracias europeias, para se perceber os compassos de tudo isto, o caso que merece reflexão, reflexão urgente, esforcem-se, é a intervenção do sr. Wolfgang Schäuble, ministro alemão das finanças.


Não se trata de mais um ministro, a gente vê-os desfilar, são muitos, andam por aí aos montes. É que o sr. Schäuble é amigo e camarada dos bancos alemães, é o ministro que tutela as finanças da Alemanha que, por sua vez, é o país patrão dos países da união europeia e patrão de muitos comanditários.


Este mais que poderoso ministro deu-se ao luxo de criticar esta quarta-feira a decisão da agência de rating norte americana Moody's que desclassificou Portugal para o nível supremamente inferior abaixo do qual deixa de haver qualquer nível. Os senhores da Moody's, os mesmos que recomendavam os títulos tóxicos do Lehman Brothers, mandaram-nos agora para o lixo. Lixados, what else?


«Estamos tão surpreendidos com a decisão dessa agência de rating como todos os outros, não compreendo o que está na base dessa avaliação», disse o sr. Schäuble, em conferência de imprensa.



O ministro ficou surpreendido e eu fico surpreendido com o facto de ele estar surpreendido. E fico surpreendido porquê?



Faz parte, desde pelo menos os tempos do Príncipe de Maquiavel que a principal qualidade dum político é que nunca seja apanhado nas teias de surpresas imprevistas. Não estou a citar, mas a ideia é essa, quem manda, quem tem poder só consegue guardar esse poder se não for surpreendido por coisas, factos, acontecimentos imprevistos. Político que é político sabe prever o que se vai passar amanhã, depois de amanhã e no próximo século. Se não sabe, se não tem o dom da presciência e se quer ter algum sucesso na vida, o melhor que tem a fazer é ir roubar para a estrada, por outras palavras, procurar um lugar num conselho de administração e tratar da vidinha.



Gozar das sinecuras de conselho de administração estilo Lusoponte isso não é tarefa de político. É que ser político, fazer política é coisa séria. Em Portugal não é coisa séria, como se sabe, isso está mais que comprovado. Mas na Alemanha não se brinca com essas coisas.



Sendo um político alemão de alto gabarito, o senhor Schäuble é certamente um político a sério, pelo que logicamente fico surpreendido quando ele vem afirmar que ficou surpreendido com a decisão desses empregados do capital financeiro tóxico conhecidos por agência Moody’s.



Tenho para mim que o sr. ministro alemão teve antecipadamente, e atrevo-me até a supor que estará talvez na origem, da decisão desses empregados.



E digo ao sr. ministro alemão, mando-lhe daqui deste lugar periférico à beira do Tejo donde partiram as caravelas, a seguinte mensagem.



A Alemanha dos grandes interesses financeiros e especulativos engajou-se num extraordinariamente perigoso jogo especulativo. Essa Alemanha conspira contra a democracia, conspira contra a Europa, conspira contra a paz. Essa Alemanha faz o jogo da ditadura do capitalismo tóxico e dos seus homens de mão. Ontem foi a Moody’s, amanhã ou depois de amanhã vão ser a Fitch, a Standard & Poor’s e a DBRS. Daqui a um, seis ou doze meses, vão ser os coronéis, os generais e os sargentos.



Jogo especulativo extraordinariamente perigoso que põe em confronto de carácter bélico, e isso é cada vez mais claro, os povos do norte da Europa contra os povos do sul. Os do norte, embalados pela sua fugaz prosperidade, cujo vértice cíclico pode estar no fim, e que, entrincheirados nos seus opulentos preconceitos anti-meridionais, desprezam e condenam os povos meridionais preguiçosos, corruptos e burros, raça inferior. Não querem, do alto da sua egoísta e suicidária arrogância, pagar a crise dos países do sul, países explorados pelos bancos e pelas multinacionais alemãs e outras Nokias.



Este confronto belicista justificado pela pretensa superioridade moral, civilizacional e rácica do norte da Europa tem que ser desmistificado.



Não fiquemos, pois, pela espuma das coisas.



O assunto das agências de rating, nada disto tem a ver com um ataque americano contra o euro.



A América entrou no ciclo da decadência dos impérios. A América precisa de exportar, o principal credor externo da América é a China, seu adversário número um, a América precisa de exportar, a América agradece o euro forte.



As agências especulativas norte-americanas apenas estão a fazer o seu trabalho, é um trabalho de porcos, sem desprimor para os ditos animais. Elas são criação do capitalismo financeiro que se alimenta de falcatruas, de engenharias virtuais, de falsas promessas e de vigarices. As agências de rating americanas são filhas desta nova cultura do capitalismo financeiro tóxico e trabalham para quem lhes pagar melhor.


Serão pagas nesse dito trabalho de porcos pelo governo americano? Nenhum indício racional e credível aponta nesse sentido.



In questo momento, l’America è tropo lontana. I Tedeschi sono tropo vicini.



O lixo tóxico atirado pelas agências de rating contra os países periféricos do sul da Europa não desresponsabiliza nem cada um dos países atingidos (Grécia, Portugal) ou a atingir (Itália, Espanha), nem os países que estão por detrás desse ataque (identifiquem-se).



Ao contrário do que li hoje, 7 de Julho, no Público, não é verdade que a partir de agora “já não é nada connosco”. Bem pelo contrário, tudo o que se está a passar, tudo o que vai acontecer nos tempos dramáticos que estão à nossa frente tem a ver connosco.



Não nos deixemos intoxicar pelos conspiradores do fascismo financeiro que quer sufocar as democracias da Europa.



Não fiquemos à espera dum Messias enviado por Bruxelas.



A união europeia não é, nunca foi nem, nunca será a Terra Prometida.



Contemos apenas connosco próprios. Em época de globalização essa é a lei, tudo o resto são contos do vigário.



1 comentário:

Anónimo disse...

Quando tudo se trasformar em cinzas, talvez estes povos se unem, se livrem desta cambada que os governa e acordem.

jose antonio